Last Updated on: 7th agosto 2024, 04:02 pm

Pode até ser que você nunca tenha ouvido falar na Ilha do Ferro, mas quem é um leitor fiel do Histórias de Casa certamente já se deparou com muitos artesanatos e obras de arte produzidas por lá nas casas que mostramos aqui no blog. Isso porque esse pequeno povoado alagoano à beira do Baixo São Francisco se tornou um polo cultural quando o assunto é arte popular.

Tudo começou com o ‘Bordado Boa Noite’ e os bancos de madeira esculturais de Seu Fernando, que se tornou um símbolo por ter sido o primeiro artesão da Ilha, com um trabalho que ganhou reconhecimento e abriu novas portas para a cultura na região. Como legado desse despertar artístico, nomes como Valmir, Petrônio, Dedé, Roxinha, Jailton e Zé Crente foram lançados e se tornaram reconhecidos pelo Brasil inteiro com seus trabalhos em madeira entalhada, bordado, pintura e outras técnicas manuais.

Com tantos talentos locais, a região tem atraído turistas, que viajam a fim de conhecer os ateliês, conversar com os artesãos e entender um pouco mais sobre a rotina por ali. Ao chegar, os visitantes encontram ruas pacatas com crianças brincando do lado de fora, fachadas singelas e coloridas, e senhores sentados em cadeiras na calçada. Além de — é claro – uma bela paisagem da natureza sertaneja, com o bioma da caatinga encontrando a grandiosidade do Rio São Francisco.

Esse contexto é pano de fundo para que os artesãos traduzam suas realidades por meio da arte. Grande parte das obras produzidas na região retrata animais, fachadas ou a cultura de lá. Em muitos casos, troncos retorcidos servem de ponto de partida para dar forma a móveis e objetos de madeira.

É claro que nós, do Histórias de Casa, tínhamos muita curiosidade de nos aprofundar na história desse lugar tão presente em nossos conteúdos, mesmo que indiretamente, então quando soubemos que o Felco – um dos fotógrafos parceiros do blog – estava com uma viagem marcada para lá, não deixamos passar a oportunidade de reunir seus registros e dicas de roteiro por aqui.

Com um talento incrível para fotos de arquitetura e viagem – e também para puxar boas conversas com quem encontra pelo caminho – o Felco é o convidado de hoje para nos guiar em um pequeno tour pela Ilha do Ferro. Quem sabe vira o destino da sua próxima viagem?

Dicas de roteiro na Ilha do Ferro, por Felco

Dica 1: Um bom roteiro começa no Bar do André!

Segundo o Felco, as coisas na Ilha “acontecem naturalmente”. Como todos se conhecem, uma pessoa vai levando à outra. Mas se você quer um bom atalho, o André é um ótimo ponto de partida para as suas descobertas, isso porque, além de ser dono de um bar que fica bem no centro do povoado, ele também é praticamente uma enciclopédia e, não só conhece todas as dicas, como é um grande fomentador da arte e do turismo por ali, fazendo pontes entre esses universos.

Dica 2: Se realmente quiser uma imersão na região, não vá com pressa!

O povoado tem um ritmo próprio: os encontros podem render conversas que se estendem por horas ou acabar levando a alguma indicação de lugar para visitar ou outra pessoa para conhecer. Ir sem pressa e estar aberto para as possibilidades que aparecem são uma ótima maneira de aproveitar ainda mais a experiência.

Dica 3: Segunda-feira em Pão de Açúcar

Se você chegar na Ilha do Ferro na segunda-feira, é provável que encontre uma cidade vazia, porque no começo da semana muita gente vai fazer a feira em Pão de Açúcar — a cidade mais próxima. A dica é fazer o mesmo, e na sequência da feira, aproveitar para conhecer o forró do bar do Vaqueiro, também em Pão de Açúcar.

Dica 4: Encante-se ao conhecer os artistas <3

Geralmente as casas com ateliês de artistas têm placas na fachada, mas a verdade é que as figuras mais representativas para a arte local estão na boca do povo. Como muitos artesãos também exercem outras atividades na Ilha, nem sempre os ateliês estarão abertos, mas se estiverem, é só entrar.

Na sequência, você pode conferir alguns artistas que o Felco visitou e fotografou durante a viagem.

Mestre Petrônio

O ateliê do Petrônio fica no fim da rua principal, em um lugar um pouco mais afastado e repleto de natureza. Além de se dedicar à arte, Petrônio adora cuidar de suas plantas e entende muito sobre madeira, sua matéria-prima para criar figuras fantásticas. Não é à toa que ele se tornou um dos artistas mais reconhecidos da Ilha do Ferro. Mas não é só o Petrônio que encanta na visita, sua esposa Célia é super carismática e boa de papo!

 
Roxinha e o marido Domingos

O ateliê do casal fica na entrada de Palestina, um povoado ao lado da Ilha do Ferro, e tem desenhos por todas as partes. Felco brinca que ao entrar ali, a impressão é de estar entrando na mente de Roxinha, com pinturas que retratam suas memórias e cotidiano. Seu marido, Domingos, também usa o espaço para fazer esculturas de madeira.

Vieira
 
Em uma visita mais rápida, Felco também conheceu o ateliê do Vieira, que fica logo na entrada do povoado. Com um perfil mais reservado, ele impressiona pelo trabalho minucioso com as esculturas que produz. Por lá, Felco não encontrou nenhuma peça além da que estava sendo produzida: isso porque a demanda é tão grande que até mesmo a única restante já estava reservada.

Dona Morena

Dona Morena é um verdadeiro símbolo na Ilha do Ferro: uma senhora de 98 anos que até hoje é ativa na cultura da cidade e costura bonecas de pano sem precisar de óculos. Impressionante, né?

Zé Crente

Assim como Vieira e Petrônio, Zé Crente faz parte da “velha guarda” dos artesãos da madeira, inspirada pelo trabalho de Seu Fernando. Suas máscaras têm tanta demanda que seus filhos passaram a ajudar com a pintura das peças, mas, além disso, Zé Crente também faz outros tipos de esculturas e até móveis. Ah, e um fato curioso: além de artesão, ele também é coveiro!

Por fim, outros lugares que vale a pena conhecer:

Ateliê Boca do Vento: a casa de Seu Fernando, onde a história do artesanato em madeira começou no local. Hoje em dia, o espaço é tocado pelos filhos e netos, que continuam o legado das obras de arte.

Museu da Ilha do Ferro: um museu em homenagem ao Mestre Fernando, por quem todo o vilarejo nutre o sentimento de gratidão. Ali estão reunidas não só obras dele, como de outros artesãos do povoado.

Mais ateliês de artistas: como a Ilha do Ferro tem muitos talentos das artes, a lista de ateliês é extensa e Felco não conseguiu visitar todo mundo. Algumas dicas extras são o ateliê do Dedé, que fica no povoado, ou o de Clemilton, um pouco mais afastado.

Cooperativa Art Ilha: cooperativa de bordadeiras da Ilha do Ferro, que continuam o legado do Bordado Boa Noite, produzido há tempos pelas mulheres da região.

Cabra: um espaço de cultura com exposições e outras atividades para promover as manifestações artísticas.
 
Passeio na Ilha dos Anjos: como na Ilha do Ferro a atividade pesqueira acaba atraindo Pirambebas, uma espécie de piranha da região, a dica para quem quer tomar um banho no Rio São Francisco é atravessar de barco até a Ilha dos Anjos, que tem esse nome porque é onde as crianças eram enterradas quando faleciam.

Passeio no Lajedo: uma espécie de parque ambiental repleto de pedras que antigamente servia como reservatório de água. Na época de seca, é possível caminhar entre as rochas, já durante o período de chuva, o espaço fica coberto por água. O passeio é guiado pela Jeusa, que explica também sobre a fauna e flora do lugar.

A Ilha do Ferro é, sem dúvida nenhuma, um lugar mágico à beira de um rio maravilhoso, onde tudo funciona em outra lógica de tempo e ainda é possível ver muita arte linda! Mas, acima de qualquer coisa, é um lugar com pessoas incríveis e é delas que você sente saudade quando vai embora

Texto por Yasmin Toledo | Fotos e roteiro por Felco